“Como eu fico?”

Confesso que eu não queria escrever nada, especialmente sobre este assunto, porque eu acho que já me desgastei muito com ele. Mas não deu pra segurar. O desabafo não foi grande o suficiente ainda. Aliás, esta é outra confissão. Este texto é um desabafo. Um verdadeiro desabafo. Porque babaquice alheia me cansa. Tudo bem, não dá para entender nada ainda. Então vamos apelar para a didática (que eu não tenho muita, mas tentemos aqui nos fazer entender).

Pense em uma associação. Uma hipotética, claro. Ela se chama, por falta de criatividade, Clube da Luluzinha (CL). O CL tem uma parte responsável por organizar reuniões, debates, assembleias, esse tipo de coisa. Só que, para que tudo o que essa parte organiza funcione direitinho, é preciso haver algo chamado “quórum”. Eu digo o que é o quórum se você não sabe. “Quórum” é a quantidade mínima de pessoas que devem estar presentes na reunião/assembleia/discussões para que se tenha validade. Até onde eu sei, equivale a 10% (pouco, eu sei).

Muito bem, foi convocada uma assembleia geral para o CL. Para facilitar o cálculo, vamos supor que o CL tenha 100 membros. Logo, 10% são 10 pessoas. O assunto da assembleia é pertinente e espera-se que muito mais que 10 pessoas apareçam. Espera-se que a maioria (definida como 50%+1, o que, no caso, são 51 pessoas) apareça. Especialmente porque a assembleia foi marcada com a devida antecedência e teve a devida divulgação, o que permite que as pessoas se planejem para irem à assembleia.

Chegado o dia marcado e dado o tempo limite para se atingir o quórum, contam-se as pessoas. Surpreendentemente, os presentes totalizam 10% do CL. Qual a representatividade das opiniões expostas no CL então? Ora, teoricamente, toda, pois se teve quórum, foi uma assembleia perfeitamente válida. Assim, o resultado da assembleia, depois de diversas discussões, é divulgado.

Metade do CL se posiciona contra a decisão.

“Mas não havia representatividade?”

Teoricamente? Sim. Eu não acho que 10% seja um bom valor. Especialmente quando se tem muito mais gente compondo o grupo para o qual a assembleia foi convocada. Mas voltemos. Com tantos contra, fica a pergunta: por quê? Pelo simples fato de que as pessoas não entenderam (ou não entendem ainda) o que a presença na assembleia significava. Presenciar o debate não é aprovar ou rejeitar algo. Ter a presença ali não é votar contra ou a favor. Ao contrário. Muito ao contrário. Estar ali é se dar a oportunidade de falar, é se representar, é poder expor a própria opinião e ouvir a dos outros.

É chegar a um resultado verdadeiramente representativo.

Mas, para os integrantes do CL, o ato de não ir à assembleia (na ridícula esperança de que não houvesse quórum) significava que não havia concordância com o tema. Que se era contra o que estava sendo proposto. Assim, com 90% ausente em sua falsa representação de discordância, deu-se a assembleia e discutiu-se o tema proposto. No fim, chegou-se a uma decisão que foi divulgada oficialmente aos 100 integrantes do CL.

Uma decisão que foi sabiamente acatada por uns e profundamente criticada por outros. Outros que não tinham (ou fingiam não ter e eu, particularmente, aposto mais nesta última opção) consciência de que não ir à assembleia significava concordar com o que fosse decidido por quem foi e discutiu. Por quem votou. A decisão da maioria é referente aos presentes na assembleia. Se 10% estavam lá, o 50%+1 é referente a eles (no caso, 6 pessoas) e não ao grupo todo (as 51 pessoas citadas anteriormente).

Enquanto as pessoas não forem capazes de entender isso, o problema da falta de representatividade desses 10% continuará a existir. Diversas desculpas para o não comparecimento aparecerão e cada vez mais a união do grupo será reduzida devido a decisões que vão contra o que a maioria dos integrantes quer. Mas o que fazer quando estes mesmos integrantes que reclamam das decisões não comparecem aos debates em que elas são tomadas?

O ponto de tudo isso é, para variar, a triste realidade em que vivemos. Movimentos populares são cada vez mais frequentes e visíveis e existem não só nas ruas, mas também dentro de, por exemplo, universidades. E o que eu vi ontem, de pessoas que vejo com frequência (algumas com uma frequência indesejada, mas não importa agora), entristeceu-me de tal forma que não pude me calar.

Manifestei-me para eles, para amigos que não estavam envolvidos e, agora, para você que se deu o trabalho de ler até aqui (aliás, muito obrigada e, por favor, leia até o fim). Nessa manifestação minha, comecei a tremer. Não de frio (porque estava realmente frio, mas providências foram tomadas), mas de raiva. Raiva da mesquinharia e do egoísmo de muitos estudantes. Colegas, amigos. A dificuldade (medo, talvez) em deixar de olhar para o próprio umbigo por um instante.

Abrir a cabeça, pensar no próximo.

Pessoas que, assim como eu, sofreram e ainda sofrem com a má-estruturação do curso. Pessoas que sabem que outros passarão por isso ainda, que sabem que outros estão passando. Pessoas que, mesmo assim, se preocupam mais consigo mesmas. Que não conseguem olhar adiante se não for para se ver com um diploma na mão (coisa que hoje em dia é comprável) e um trabalho. Eu aposto que elas terão um trabalho exaustivo, mas não farão nada a respeito.

Fazer exige sair da zona de conforto.

Elas agem como se nada fosse com elas. Até, claro, a coisa apertar. Até “a água bater na bunda”, como vi muitos amigos (que foram na assembleia e/ou concordaram com o resultado) usarem. Mesmo as que não concordavam, mas foram. De fato, muitas pessoas só agem quando se sentem encurraladas. Ou melhor, reclamam. Porque é mais fácil reclamar e dar argumentos estupidamente babacas. Reclamar, em especial e sem qualquer moral, da falta de representatividade. Para finalizar, deixo o que disse aos colegas que só reclamaram, para os primeiros a quem me manifestei.

Vocês não se manifestaram quando foi dada a chance, o que é a mesma coisa que dizer que acatam as decisões de quem foi. Gente, não ter quórum significa adiar o debate. Debate. É pra isso que serve a assembleia. Vocês estão reclamando da representatividade, mas não quiseram expor seus pontos de vista. Afinal, reclamar da decisão é mais fácil. Reclamar com e dos poucos que se deram ao trabalho de fazer alguma coisa é muito mais confortável, eu sei. Admito que não fui nas assembleias, mas não me incomodo com a greve. Minha consciência está limpa porque eu sei que não ir equivale a concordar com a decisão tomada, que não ir significa não ter a chance de me expressar. Pensem no que a gente sofreu. Pensem na grade atolada de coisas, nas aulas corridas e intermináveis. Nos quase 40 créditos (em um único semestre). No tempo que nos é dado pra fazer tudo que nos é exigido. Nas noites de sono perdidas, nos ataque de estresse. Pensem em quem vai passar por tudo isso. Eles merecem? Nós merecemos? Os horários apertados, a galera que leva mais que horas pra ir pra casa, o estresse acumulado pelo dia inteiro sobrecarregado, o não conseguir estudar&dormir porque acham que alunos são máquinas, a imposição de “superiores” desde as coisas mais simples e babacas, a falta de condições… É com isso que vocês querem continuar? A maior preocupação de vocês, de verdade, é uma avaliação falha, que te dá um mero número em retorno? Ou a preocupação de vocês é com o que vão pensar? “Nossa, greve, esse povo é tudo vagabundo mesmo”. É isso que vocês acham que a greve significa? É disso que vocês estão com medo? Por que a maior preocupação de vocês é com a prova? Por que reclamar de algo com que vocês mesmos colaboraram (e aqui falo da falta de representatividade de que tantos falam)? Se não existe o 50%+1 é porque não houve a boa vontade de completarem o 50%+1. Se querem representatividade, façam-se presentes. Coloquem a opinião de vocês na próxima assembleia. Representem aquilo que vocês querem. Concordo que não é maioria. Aliás, é um número extremamente baixo considerando o tanto de gente que tem na nossa faculdade. Mas desse mesmo tanto, foi o pessoal que conseguiu ir, independentemente do motivo. (…) Somos uma comunidade em que 90% prefere reclamar das decisões depois em vez de participar dos debates em que elas são tomadas.

A questão que fica no fim de tudo isso é… Afinal, como nós ficamos?

Kissu,

Kuma.

Sobre Rikuki

Três garotas bloggando pra passar o tempo =)
Esse post foi publicado em Kuma e marcado , , , , , , , , , , . Guardar link permanente.

Deixe um comentário