A sujeira debaixo do tapete

Devo admitir que, enquanto pensava no que escrever, várias ideias me vieram e eu não sabia mais como começar o texto. E sim, eu sei que já tratei desse tema antes, mas parece que nunca é demais na sociedade em que vivemos, em que as pessoas, independentemente do grau de educação que tenham ou de onde morem, parecem teimar em entender algo que devia ser, convenhamos, óbvio. Mas vamos do começo.

Por que esse título?

Porque o tema aqui tem um passado tão profundo e uma existência que tantos parecem tentar esconder que me pareceu uma comparação adequada. É como aquela poeirinha que não queremos que a visita veja e jogamos debaixo do tapete. É pouco, quem vai perceber? Mas ela está lá e, com o tempo, aumenta. Quanto mais tentamos disfarçar a situação sempre jogando para baixo do tapete, mais a pioramos e, um dia, uma limpeza vai se fazer necessária. Um dia, aquela sujeira vai ter que ser realmente removida.

Mas do que diabos se trata o texto afinal?

Não, não é sobre a pesquisa do IPEA. Não exclusivamente. É sobre um tema que todos devíamos ter sempre em mente, porque é algo sério e extremamente danoso. O abuso. Não importa se é com a mulher, com o homem, com um ateu ou um religioso, com um hetero, bis, trans, homossexual. Ou mesmo alguém que se considere assexuado. Os de gênero fluido, por que não? É sobre todos nós, culpados, cúmplices e vítimas.

Quantos já não ouviram que “fulana foi estuprada (e aqui darei os exemplos com mulheres porque elas são as maiores vítimas da história até onde eu sei) porque estava usando uma saia muito curta” ou que “ela estava pedindo vestida daquele jeito”? Ou ainda que “mulher devia saber se comportar”, que “devia por os peitos dentro da roupa e procurar um homem de verdade” ou que “não devia andar por aí vestida assim (e pense em qualquer roupa usada para justificar a história) sabendo como as coisas estão”?

Afinal, por que a culpa recai sobre a mulher?

Li hoje algo que me fez parar para pensar em algo que nunca tinha pensado. Quando se diz que a culpa é da mulher por ela “não saber se comportar”, ao mesmo tempo diz-se que o homem (o que estuprou, o que estupra, o que estuprará ou mesmo os que não estupram, mas concordam com a mentalidade) não é nada mais que um animal irracional, não é nada mais que instinto, um bicho que não evoluiu. Ofende-se, portanto, tanto homens quanto mulheres. Você, leitor, gosta da ideia de ser retratado como alguém que não sabe se controlar quando vê uma mulher na rua?

Eu não gostaria.

Mas a culpa nunca é da vítima. Quem, em sã consciência, iria querer sofrer tamanha humilhação? Quem iria querer ser violada dessa forma? Sofrer um trauma desse tamanho e passar a viver com medo de andar entre as pessoas, porque nunca se sabe quem irá ou não submetê-la novamente a algo assim. Imagine o temor de andar na rua olhando para todos os lados como se todos fossem “o inimigo”. Imagine o pesadelo que a vida da pessoa passa a ser, o terror que se repete incansavelmente na mente de quem passa por isso.

O abuso deve ser denunciado e combatido. Esteja usando uma burca ou uma saia curtinha, mulher nenhuma merece o desrespeito, a invasão a seu corpo. Mulher nenhuma nem pessoa nenhuma, porque homens também podem ser vítimas de estupro. Acho simplesmente ultrajante quando acham que a orientação sexual de uma pessoa pode ser “corrigida” (quê? Como raio se corrige algo que não está errado?) com um ato sexual forçado. Tão ultrajante – se não for mais porque são duas ideias absurdas e machistas ao extremo juntas – quanto fazer qualquer um de vítima de uma prática tão hedionda e, infelizmente, tão comum.

Não acho que esse seja um texto que precise se estender demais. Afinal, quantas coisas já não foram ditas sobre esse tema? Quantas discussões já não se passaram? Quantos já não tiveram que aprender na própria pele o que esse abuso significa? Mas, mesmo com tanta dor, com tanto sofrimento, com tanta incredulidade, as pessoas continuam se achando no direito de culpar a vítima pelo que aconteceu. A culpa nunca, em hipótese alguma, é da vítima.

Para terminar, deixo vocês com um gráfico bastante didático que achei simplesmente genial, apesar de representar algo que é ridículo de tão óbvio.

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Kissu,

Kuma.

P.S.: a ideia original era bem maior, talvez até bem mais ampla. Mas eu me sinto tão cansada de falar sobre isso sem ter resultados que achei melhor deixar assim mesmo. O fato de ter outro texto que aborda esse mesmo assunto ajudou, porque eu imaginei que ficaria muito repetitivo se me estendesse mais aqui. De qualquer forma, espero que tenha sido do agrado da maioria e, para aqueles que não foram, saibam que eu não me arrependo. Afinal, se não incomodasse, não mudaria nada, não é?

Sobre Rikuki

Três garotas bloggando pra passar o tempo =)
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